Sunday, September 30, 2007

Retrato do artista quando nu

Por Ary Salgueiro

Yukio Mishima fez esta sessão de fotos em que simula o harakiri que, posteriormente, executou. Em nome do Japão. Aqui um vídeo sobre seu narcisismo e gostos.

Os críticos ferrenhos da futilidade e desrespeito dos tablóides e demais papéis amarronzados, muitas vezes (e, para pagar a multa por generalização simplista, entre eles me incluo), também são consumidores de notas de rodapé biográficas que desnudam autores discretos e, fora dos livros, silenciosos.

À vezes nem tão silenciosos, é verdade. Muitos artistas, coerentes com a missão de serem artistas e, portanto, aparecer, brilhar, gritar, utilizam cacoetes, a má fama, o factóide, até o corpo (!) para levar a obra ao mundo e, tendo isto como ajuda, tentar eterniza-la e eternizar-se. Sempre me lembro de Genet, e as suas histórias mentirosas, sua crueldade duvidosa, e de sua genialidade, carregando uma obra que falou desse mundo imaginário do ladrão. Um autor brasileiro que, descobri sem querer, segundo fonte segura, por mais que se anuncie proletário, é um Czar em pele de bolchevique. Outro acolá forja a antipatia. Outro ali, a simpatia.

Há outros que, não por cálculo, mas por natureza, são chamativos ou até espalhafatosos: os suicidas (especialmente os teatrais, como Mishima), aqueles que servem de bandeira (gays, nazistas, umbadistas, negros ou gagos), ou simplesmente discretos demais e misantropos. Aparecem estes quase ou totalmente de modo involuntário. No caso de Salman Rushdie, por exemplo, que depois de ter escrito o seu Versículos Satânicos, foi condenado pelo falecido Aiatolá Khomeini à morte, a ser executada por todo verdadeiro fiel do Islã, enfim, como poderia este curioso fato não ser um meio divulgador de sua obra e de sua personalidade? Como não conhecer Manuel Bandeira como o mais resistente dos tuberculosos e por sua vida “que poderia ter sido e que não foi”?

Fotogênico Picasso. Mais fotos dele e mais
outras matérias sobre arte aqui.

Pensei no assunto depois de ter descoberto o filme Mystere Picasso (completo no Youtube). A idéia era filmar Picasso pintando. A primeira cena do filme é o pintor caminhando de bermuda e camiseta regata até duas pinturas suas, em meio a uma fala que comenta acerca do desejo de se descobrir o que o artista pensa enquanto cria, conhecer “o mecanismo secreto que guia o artista na sua perigosa aventura”. Na arte da pintura, diferente da literatura ou da música, seria mais fácil de se verificar este processo criativo, apenas questão de ver passo a passo o movimento do pincel, o que de fato o filme mostra. É, entretanto, na fantasia que o filme se apóia. A intimidade com que Picasso se apresenta parece, para mim, algo como encenação e, além disso, o cineasta espalhou o mito de que, após as filmagens, as telas seriam queimadas (o que, de fato, não ocorreu).

O filme que, em sua efemeridade torna o instante criativo ainda mais precário e fugidio, e ao mesmo tempo tenta arquiva-lo, é, acredito, metáfora deste processo de desnudar o autor. Conhecer o artista nu é, provavelmente, parte da atividade do apreciador de compreender a obra, o que o leva a um ambiente normalmente estranho, encantador ao ponto de lá prende-lo e cativa-lo, mas parcial, no sentido de que apenas pode vislumbrar a idéia fundamental que iluminou um momento da vida do autor e que o cristalizou naquele objeto de reflexão.

Kafka, tão imenso que não coube no texto, não mandou
que seu amigo Max Brod queimasse toda sua obra, mas
só algumas delas. Inclusive, que se desfizesse das cartas,
o que Brod, prontamente, desobedeceu.

Por este ponto de vista, a construção do sentido pode ser uma ponte que, de fato, é o leitor do texto que constrói, mas substancialmente com o material retirado do sonho do autor, que apenas se pode tentar adivinhar, e, como se não bastasse, em busca do próprio autor, escondido no tempo, que aprendemos a amar e apaixonadamente procuramos. Mas este, o autor, é obra perdida, livro proscrito, e assim é melhor que seja.

Wednesday, September 12, 2007

Para além da roda: Literatura Marginal

Na beira, nos lados, fora do centro. É isso que significa ‘’marginal’’. Mas quando falamos em Literatura Marginal, estamos falando de uma literatura à margem do quê?

Essa denominação é usada quase sempre em referência à um movimento mais ou menos delimitado ou restrito e que corresponde a um grupo de escritores que, na década de setenta, inspirada pelo movimento da contracultura e encurralada pelo clima de tensão causado pela ditadura, começou a publicar e fazer circular sua produção de maneira alternativa. Esses artistas costumavam imprimir seus textos através de mimeógrafos e confeccionavam pequenos livros artesanais, distribuindo-lhes de maneira independente. Seus autores eram muitas vezes os próprios vendedores.

Além dessa ruptura com o mercado editorial tradicional, que não conseguia abarcar essa produção, se é que ela queria ser por ela abarcada, os chamados marginais trouxeram também uma série de inovações estéticas, destacando-se principalmente o uso generalizado da linguagem oral dentro predominantemente dentro do gênero da poesia. Isso fica claro em poemas que quase sempre prescindem de rimas ou métrica e que costumavam possuir temáticas extremamente próximas do cotidiano.

Podemos dizer que o Modernismo, cujo marco é a Semana de Arte Moderna de 1922, já havia proposto essa aproximação do dia-a-dia na literatura, mas isso com o objetivo principal de buscar e formar uma identidade nacional, seja ela mais ou menos idealizada. Prova disso são os seus conseqüentes desdobramentos nas décadas seguintes, em que o romance buscou retratar as realidades regionais e o povo do nosso país, enquanto a poesia começava a questionar os aspectos de ser e estar nesse mundo entre e pós-guerra.

Entretanto, a Geração Mimeógrafo, como também é chamada esse agrupamento de escritores de idéias mais ou menos afins, traz esse uso da linguagem cotidiana não como simples apropriação da linguagem popular, mas como sua própria linguagem, isto é, em toda a sua subjetividade trespassada pelo dinamismo da vida urbana. Da mesma forma se dá com os temas e demais aspectos dessa literatura. Até mesmo a maneira dessa literatura circular, já que os livros manuais eram vendidos em cinemas, barzinhos e lugares culturais, já era uma forma diferente de habitar e fazer uso do espaço urbano.

Dentre os escritores que fomentavam esse novo movimento cultural podemos citar, entre outros, Cacaso, Chacal, Francisco Alvim e Ana Cristina César. Esses artistas, porém, ao contrário do que poderia sugerir o termo ‘’marginal’’, não estavam tão a parte da sociedade. Pelo contrário, eram quase todos provenientes do eixo Rio - São Paulo, ou ainda Minas Gerais e Brasília, e trabalhavam quase sempre como profissionais liberais ou funcionários públicos, ocupações portanto tipicamente da classe média.

Talvez por isso nos últimos anos esteja-se usando a nomenclatura Literatura Marginal de uma maneira mais ampla do que falamos até então. Esse novo conceito abrangeria toda e qualquer produção literária que tivesse como origem os setores menos privilegiados da sociedade. Passa-se então de uma delimitação mais estética para uma classificação que leva em conta o contexto sócio-econômico em que esses autores estão inseridos. Poderíamos englobar então sob esse rótulo desde escritores oriundos das periferias dos grandes centros, como Férrez, que organizou a coletânea Literatura Marginal, Paulo Lins, autor do romance Cidade de Deus, até a poesia de cordel, que sempre esteve à margem do circuito acadêmico oficial.

É nessa perspectiva ampla e não puramente acadêmica que as discussões nas Rodas do Por Mais Leitura desse mês devem se desenvolver. Até que ponto a origem de um trabalho e seu contexto devem ser levados em conta na apreciação da obra? O caminho da aproximação do coloquial é hoje ainda interessante? Que contribuições essa Literatura Marginal ainda tem a nos oferecer?

Independente da resposta para essas perguntas, fica aqui aberto o debate que vamos ter tanto aqui no blog quando nas Rodas de Leitura. Controvérsias à parte, entretanto, fica a certeza de que esse tema nos proporciona ótimos autores e textos para serem compartilhados, como em breve poderá ser conferido também no Roda Virtual.

Saturday, September 08, 2007

Caça Literatura na Internet

Hoje as dicas de site tem sotaque diferente, ou melhor, sotaques diferentes. Espalhada pelo mundo, a lingua espanhola lambe o mundo com uma cultura impressionante, plural, ardente. Aqui na América e lá na Espanha há um mundo literário que é imperdoável não se conhecer. Na verdade, imperdoável mesmo é não trocar, compartilhar, dialogar com nossos vizinhos de terra e alma.

Selecionei estes aqui:

Literatura Argentina Contemporanea

Site excelente que trata de biografar e diponibilizar trechos de alguns literatos argentinos. Mantem, além do mais, espaços para entrevistas, cartões virtuais engraçadinhos e um forum...

Bestiario

Coleção de blogs espanhóis. Os autores são de alguma forma relacionados, até onde vi, por artes, coisa do gênero. Textos ótimos...


El Poder de La Palabra

Site estranhamente abrangente, tem uma porrada de escritores, não somente de lingua hispânica. Me perco lá...

Banda Hispânica da Revista Fagulha/Jornal da Poesia


Esta aqui é especial. Uma iniciativa paulisto-cearense-hispanica, este acervo interessante separa por país alguns escritores, numa tentativa de gerar contato entre eles e a nossa ilha.

É isso...