Wednesday, June 11, 2008

Biblioteca Vagão de Leitura!


Nome: Biblioteca Vagão de Leitura


Localização: Rua Costa Barros, na Praça da CeArt, próximo à Barão de Studart
Horário de Funcionamento: segunda à sexta-feira, das 12h às 18h.
Contatos: Setor de Administração da Praça Luiza Távora (a biblioteca não possui telefone): (85) 31011624. Falar com Dra. Josete Andrade, coordenadora dos setores de Artesanato e Economia Solidária) ou mandar email para: renediasalves@ hotmail.com , funcionário da Biblioteca.
e-mail: renediasalves@ hotmail.com


A Biblioteca Vagão de Leitura, conhecida por alguns por "Biblioteca Luíza Távora", em virtude de sua localização na praça homônima, popularmente conhecida por Praça da CeArt, é extremamente bem localizada e, segundo o funcionário que nos concedeu esta entrevista, muito segura, devido à presença constante de 4 policiais, bem como do trabalho dos 8 seguranças da praça. Segundo René, não se tem notícia de tentativa de invasão ou assalto à biblioteca. No entanto, ela se encontra numa situação dificil atualmente, vez que os aluguéis de livros estão temporariamente suspensos, pois a maioria dos livros emprestados não era devolvida. No momento do cadastro, eram necessárias cópias de RG, CPF, foto e comprovante de residência, e a biblioteca repetidas vezes liga para os usuários solicitando a devolução dos livros, e sempre esbarra em desculpas e promessas de procura e breve devolução. Tal, infelizmente, não tem acontecido, o que em si é um contrasenso. Duplo contrasenso, aliás. Apesar de bem policiada, a biblioteca não tem como forçar essas devoluções e acaba sofrendo danos, ressaltando que o mais prejudicado é o usuário que devolve os livros e, agora, mesmo os corretos usuários não podem mais levar livros pra casa. Só se permite a consulta nas dependências da biblioteca. O outro contrasenso é que todo o acervo da biblioteca é de doações: nada foi comprado. Desta feita, o que foi totalmente doado agora resta sendo gradativa e criminosamente retirado das estantes públicas. A culpa? Das pessoas que não compreendem a acepção de BEM PÚBLICO: o que é público é de todos, e não pode jamais ser entendido como "de ninguém". E, sendo de todos, é responsabilidade de todos a sua preservação, sobretudo dos usuários.

Vale ressaltar que a Praça Luíza Távora é a única de Fortaleza que é do Governo do Estado. Assim, quem a mantém é o Governo do Estado, patrocinando sua segurança, pagando manutenção, funcionários, energia, internet, enfim.


Espaço físico: A Biblioteca existe dentro de um antigo vagão: ela É o vagão. O funcionário não sabe precisar o seu tamanho, mas arriscamos uns 4 metros de largura por 12 de comprimento, mas bem chute mesmo =] Os livros ficam dispostos em estantes de madeira, conforme assunto e estilo.

Acervo: Conta com 6 mil livros, todos doados.

Inscrição: Infelizmente, o cadastro não está mais sendo feito, vez que o aluguel não é permitido atualmente. Quando acontecia, para inscrever-se era necessário levar: cópia do RG, do CPF, bem como 1 foto 3x4 e um comprovante de residência. Podia-se ficar com 1 livro por 8 dias.

Frequência: cerca de 30 a 40 pessoas por dia, geralmente a Sexta é o dia em que a freqüência é menor.

Estantes: Há Estante Braille, bem como Estante de Livros Raros e Antigos; há, ainda, vários livros de arte, fotografia, pintura, etc.

Assuntos: Há assuntos de variados tipos: Infantil, Medicina, Direito, Administração, área política em geral, livros universitários, de Ensino Fundamental, Médio e Pré-vestibular, bem como provões, questões de concursos, livros de Religião...

Livros que não se podia alugar: livros raros ou muito antigos, como Enciclopédias e Livros de Coleção, a exemplo da Coleção de Monteiro Lobato, de 1969.

Funcionários: apenas um, atualmente o funcionário que nos atendeu, René Dias.



Curiosidades e estórias sobre a Biblioteca Vagão de Leitura:

-> os 5 escritores mais presentes no acervo são: Monteiro Lobato, Graciliano Ramos, José de Alencar, Agatha Christie e Beatriz Alcântara. A parte de autores cearenses é a primeira que se avista, tão logo se entra na biblioteca;

-> O livro mais antigo do acervo é "Robinson Crusoé", 1ª edição, de 1860, e há ainda um em francês, sobre "a boa conotação da mulher", de 1855;

-> Os livros mais alugados são romances, como os da Agatha Christie, e de Administração, Direito, Constituições, etc;

-> Há acesso a Internet p/ complementação de pesquisa. Costumam frequentar a biblioteca muitos estudantes para realização de pesquisa, ao que são auxiliados pelo funcionário;

-> Várias crianças do Campinho d`América visitam a biblioteca. Muitas crianças carentes, algumas até que nem sabem ler, vem pra folhear os livros, ver os desenhos, conhecer a biblioteca-vagã o. René ressalta que a parte mais pobre da cidade frequenta também a biblioteca;

-> Muita gente aparece só pra conhecer, tirar fotos, inclusive para realização de books fotográficos. Bandas dos mais variados estilos fazem fotos no local também, ressaltando que só fotos do exterior do vagão são permitidas. Uma curiosidade é que o Book da Miss Ceará foi realizado na Praça Luiza Távora, como fotos também na Biblioteca-Vagã o.

-> a Biblioteca frequentemente é tema de reportagens, locais e nacionais, em virtude da sua estrutura diferenciada. Sempre lembrando que fotos dentro da biblioteca são proibidas.

-> Sobre as estórias inusitadas que acontecem por ali, René Dias nos conta que havia uma senhora que sempre aparecia falando várias línguas, sobretudo espanhol e francês, na tentativa de tocar violino no interior da Biblioteca. Sempre lhe diziam que dentro não podia, e a mulher, já idosa, se irritava bastante e ia tocar lá fora.

Às vezes, trazia ainda um cavaquinho. Não me disse, no entanto, era se o som era agradável aos leitores e passantes (!)

Havia também uma outra senhora, supostamente mãe de um pombo, que constantemente aparecia com garrafas vazias de cerveja, formando montículos e bares imaginários, inclusive ao redor do posto policial.

Pra coroar as graças que apareciam por lá, aconteceu de um dia uma mulher nua querer entrar na biblioteca, ao que foi barrada pelos seguranças.

Bibliotecas =]

Introdução do Por Mais Leitura ao Projeto Guia das Bibliotecas:


Era uma vez um bando de leitores apaixonados que faziam uma roda de leitura. Eram cinco, foram seis, viraram sete, de repente somos vários. Ultimamente, somos muitos. De várias partes da vida, de tantas faculdades e de nenhuma. Somos de 12 anos, 45 e idade inteira, unidos por um laço suave mas jamais efêmero: o amor pela leitura. Amamos tanto que às vezes deixamos de ler para trabalhar ou discutir sobre o grupo, porque REALMENTE queremos um mundo com mais leitura.
E o que isso tem a ver com um Guia das Bibliotecas? Simplesmente surgiu a idéia da constatação – óbvia – de que as pessoas quase sempre não lêem porque não têm acesso a leitura. A desinformação e a falta de uma política una e bem fundamentada por parte da grande maioria dos políticos (e do povo, que não cobra) é talvez a maior causa das nossas mazelas sociais.
Tendo em vista isso e o nosso objetivo de ser POR MAIS LEITURA, resolvemos por em prática uma idéia já antiga: fazer uma espécie de fichamento das bibliotecas mais ricas e mais acessíveis em Fortaleza, e, curiosamente, às vezes as mais desconhecidas.
Em macro-escala qual o nosso objetivo com esse Guia? Primeiro, finalmente conseguir faze-lo (coisa que não foi simples e nem está sendo). Depois, divulga-lo e esperar que essa iniciativa sirva de alguma coisa. Se não servir, paciência, ao menos está feita.
Esperamos sinceramente que o por mais leitura não seja só um grupo de estudantes ou escritores, mas um sentimento que permeie toda a sociedade – coisa em que particularmente acredito, tomara que esse Guia fique bom e seja realmente um Guia.





1) Biblioteca Pública Governador Menezes Pimentel

1.1) Informações gerais
Nome: Biblioteca Pública Governador Menezes Pimentel
Localização: Av. Presidente Castelo Branco, 255 – Centro –Fortaleza – Ceará
Horário de Funcionamento: segunda à sexta-feira, das 8h às 21 h; sábado, das 14h às 18h
Contatos: Tel. : (85) 3101 2541 – 3101 2547 – 3101 2548
Fax: (85) 3101 2544
e-mail: bpublica@secult. ce.gov.br

Por se localizar no complexo de lazer e cultura do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, existem duas entradas: a de visitantes por dois acessos, um pela Avenida Presidente Castelo Branco e outro pela entrada principal do Centro Dragão do Mar. Atualmente, o acesso de visitantes dá-se apenas pela Avenida;
A Biblioteca Pública Governador Menezes Pimentel possui um acervo de 70 mil volumes e 40 mil títulos. Dispõe do quarto maior acervo de Obras Raras do país, onde se destacam a coleção de jornais do século XIX e livros do século XV.

Espaço Físico: A Biblioteca Pública Governador Menezes Pimentel ocupa uma área de 2.272 m², distribuídos em 5 pavimentos.

Subsolo 2: laboratórios de uso interno: setor técnico e microfilmagens, por ex;
Subsolo: Setor infantil, Administração e Salão de eventos
Térreo: Entrada/Saída do edifício (pela Av. Presidente Castelo Branco e também pelo Centro Dragão do Mar de Cultura),
Recepção (Jurema),Xerox (particular) ,
Setor de referência (falar com Fátima: esse é um setor só de consulta – tem enciclopédias, dicionários, folhetos e biografias)
Setor Braille, Setor de Informática, Setor de audiovisual e Salas de Estudo (com cabines para estudos individuais e em grupo) ; Centro Digital do Ceará (com acesso gratuito a internet, com regulamento a ser lido logo na entrada. Telefone para reserva de computador: 31412550) .
1º pavimento: Setor de obras gerais, Setor de Empréstimo e Setor Ceará
2º pavimento: Setor de obras raras, Setor de iconografia, Setor de periódicos e Microfilmes


1.2) Inscrição: Para fazer empréstimos, é preciso inscrever-se na biblioteca, o que pode ser feito com o pagamento de uma taxa única de R$ 4,00 (quatro reais), entrega de 2 fotos no formato 3x4 e da cópia dos seguintes documentos: RG, CPF, carteira de estudante, comprovante de residência ( ex: conta de luz, água, telefone, extrato de cartão de crédito, etc)

Obs! 1. Eles não dispensam o pagamento da taxa de 4 reais;
2. Crianças e adolescentes também podem efetuar empréstimos na biblioteca. No entanto, no ato da inscrição é necessário que estejam acompanhadas por um responsável. São dispensados os documentos de identidade e CPF daqueles que não houverem atingido a maioridade, contudo os responsáveis por tais crianças/ adolescentes devem apresentar tais documentos, no ato da inscrição;
3. Não se pode efetuar qualquer empréstimo no ato da inscrição. É necessário que o usuário da biblioteca recém-cadastrado aguarde a confecção de sua carteirinha, a qual, normalmente, fica pronta no prazo de um dia. Ou seja, se você fizer sua inscrição hoje, só poderá emprestar livros amanhã. ( CONFERIR ISSO, parece que mudou)

Após ter a carteirinha, o usuário pode sempre alugar 2 livros, por 15 dias. É permitida a renovação do prazo, mas só presencialmente, e, claro, levando os livros e a carteirinha. A cada dia de atraso, paga-se 0,50 por cada livro.

Obs2: curiosidade: o cadastro da biblioteca conta hoje com 4.514 registros.


1.3) Acervo:
entrevistando as acessíveis (e eficientes, que eu diga!) bibliotecárias de todos os setores, descobrimos várias coisas. Que o acervo é de livre acesso em todos os setores, mesmo aqueles em que o empréstimo não é permitido. Ou seja: seja bem vindo a entrar e mexer nos livros sempre,contanto que não os deteriore (lembre que a biblioteca é patrimônio COMUM, o que não quer dizer “de ninguém”, e sim “de todos).

Setores:

- infantil (no subsolo): lá é necessário fazer cadastro para quem não tem a carteirinha; quem já tem a do empréstimo de obras gerais (1º andar) pode usar a mesma. O acervo do setor infantil é o mais variado: livros brasileiros e não, revistas em quadrinhos, jogos e brinquedos pra crianças (poucos: uma doação viria a calhar, disse uma das bibliotecárias) . Esse setor abre as 8h e fecha às 17h. No setor infantil, há quem vá para estudar ou ler por lá, porque há mesas; e quem só passe pra fazer pesquisa e pegar os livros. Livros muito bons, devo dizer, quando voltar lá vou levar uns Pedro Bandeira e a Mafalda!

- Braille (térreo): é necessário também fazer um cadastro próprio, mas não é preciso pagar (gente, os deficientes visuais, né, que são os que fazem uso desse setor). Só cegos podem alugar, são livros que vêm encomendados de São Paulo, de graça – e vale a pena visitar essa parte da Biblioteca, sobretudo pra encontrar o Bosco, que além de ser super simpático e ter me explicado tudo, ainda é bonitão =D conheci e entrevistei o Bosco e o Luís, que falaram das dificuldades de ser deficiente visual, de como é complicado se formar, informar e ler, trabalhar e tudo que decorre disso. Mas isso é conversa pras próximas páginas. O acervo do Braille é total, brasileiros e não, literatura e não.

- Americano (térreo): setor Martin Luther king jr., aberto de Segunda a Sexta de 9 às 12h. Por causa desse horário super difícil, não consegui ir lá – ainda. Mas pode sim fazer empréstimo, e com a mesma carteirinha do empréstimo de obras gerais.

- Setor de Empréstimo (1º andar, à esquerda das escadas): literatura:
Conta com um acervo de literatura o mais variado, de todas as nacionalidades e temas e abrangências. Perguntada sobre que tipo de acervo tinha aquele setor, a bibliotecária sorriu e disse “de tudo?”, e quem freqüenta a biblioteca sabe que é verdade.

- Setor de Obras gerais - didáticos:
Aqui não pode haver empréstimo, só pesquisa. É também no mesmo espaço do setor de empréstimo, no 1º andar, mas há uma parte que pode ser alugada e outra que não. A que pode é a de literatura, se bem entendi. Bom, pelo menos nos últimos dois anos eu nunca aluguei nada do outro lado :P

- Setor de Obras Cearenses:
Do lado direito das escadas, fica ao lado dos setores de obras gerais e empréstimo, também no 1º andar. Não é permitido empréstimo nesse setor, mas o acervo também é bem vasto e esse é um grande ponto de pesquisa sobre literatura cearense.

- Setor de Periódicos (2º andar):
Consta nesse setor o 4º maior acervo de obras raras do país, entre jornais, revistas e microfilmagens. Dada a raridade e a necessidade de preservação desses documentos, os cuidados no manuseio do acervo é ainda maior, com uso de luvas e fazendo valer a máxima do “todo cuidado é pouco”, não custando lembrar que “é nosso também”.
O empréstimo não é permitido, esse é um setor de consulta e pesquisa.

Sunday, April 06, 2008

Um açogue cultural?

foto do site
Era janeiro. Estava em Brasília e peguei um ‘zebrinha’ (como chamam um tipo de ônibus pequeno) na avenida W3 Sul para a W3 Norte. Queria ver o Teatro Oficina Perdiz, que conheci por um curta exibido no Cine Ceará de 2007.

Desci do ônibus e me deparei com uma estante de livros, simplesmente. Havia uma estante de livros na parada de ônibus! Abri um deles e vi uma página carimbada com “Açougue Cultural T-Bone”. Virei-me para uma senhora que, sentada, esperava seu ônibus:
- Oi... Com licença, isso é tipo uma biblioteca?

- É... É como se fosse uma biblioteca. Dá pra pegar os livros...
- Ah é? E a senhora já pegou algum?
- Já peguei uns sim. Aproveito o tempo no ônibus pra ler.

Brasília tem um açougue na quadra 312 Norte que há mais de 13 anos é um espaço cultural. É uma loja de carnes... mas com livros. Assim que comprou o açougue, em 1994, Luiz Amorim mudou o nome para T-Bone e colocou uma estante com livros, que logo recebeu doações da vizinhança. A biblioteca cresceu tanto que ganhou sede própria em 2003, na 712/13 N, onde disponibiliza cerca de 18 mil livros.

Em 1997, a T-Bone realizou a 1ª Noite Cultural, que foi um sucesso e acontece desde então regularmente, atraindo até quem não come carne. Na 17ª edição, com show do Tom Zé, a Noite Cultural reuniu 10 mil pessoas na rua.

Hoje, além de uma biblioteca na localidade de Varjão, oficinas de arte e muito reconhecimento, a T-Bone mantém a Parada Cultural, que são bibliotecas abertas 24 horas nas paradas de ônibus da avenida W3 Norte, da quadra 510 a 712. E a chuva não consegue molhá-los pela forma das paradas e/ou das estantes. O objetivo é tornar a leitura ainda mais acessível, chegando principalmente àqueles que fazem a corrida casa-trabalho-casa diariamente, de ônibus. Os livros foram levados até eles – e são lidos. Eu mesmo peguei um sobre ecologia bem legal. :)

Para saber mais:
http://www.t-bone.org.br/

http://www.overmundo.com.br/guia/t-bone-acougue-cultural
http://www.overmundo.com.br/overblog/entre-picanhas-e-violoes

Friday, February 22, 2008

Minha Leitura: Uma vida revelada











A delicada capa de Uma Vida em Segredo da Coleção Prestígio, Edições de Ouro.


Uma garota simples, nascida e criada em sua fazenda, tem que ir para a cidade depois que seu pai morre. Chegando lá, vai morar com a família de uma prima afastada, tentando se adaptar à vida e ao mundo que a ela se impõe, sem jamais obter sucesso.

É assim, sem nenhum esforço, que podemos resumir a história de Biela, personagem que dá força e vida à novela Uma vida em segredo, de 1964, de autoria de Autran Dourado. Um enredo simples para uma personagem também bastante simples: os fatos além dos já citados são muito poucos. Temos sua tentativa de superar sua impossibilidade, vestindo os panos encomendados pela prima da prima, tentando aprender a comer à mesa, a conversar as conversas da sala de estar. Chega a copiar tão bem os gestos que se lhe apresentam que arranja um noivo, mais por confusão e conveniência do que por amor. Sua falta de habilidade, entretanto, não lhe permite ir muito longe, como demonstra a maneira como anda quando usa os seus novos vestidos, os braços sempre abertos e meio erguidos com medo de amarrotá-los. Andava parecendo um espantalho, como define o primo mais novo por pirraça.

O acaso, porém, faz aqui sua parte e por um golpe de azar ou de sorte o noivo acaba fugindo e o noivado desfeito, o que é a gota d´água para que Biela desista de tentar fazer parte da nova família, de se comportar, de ser uma senhorita.

Ela decide, então, começar a imitar a si mesma, juntando tudo aquilo que em sua nova vida remete ao seu pedaço de mundo perdido lá na ‘’fazenda do fundão’’, numa tentativa de reconstruir o seu cotidiano. Para isso do seu quarto de visitas, com porta para a sala de estar, onde foi alojada pela família, e muda-se para o quartinho dos fundos, juntos com os criados, cujas conversas despretensiosas lhe lembra as do povo simples da roça. E é sobre lá, sobretudo, que eles assuntam, todos de certa forma desgarrados de sua origem simples. Vive, a partir de então, se ocupando das atividades domésticas, trocando as visitas às cumadres da prima pelas empregadas das mesmas.

E assim segue a vida até o fim: se de início foi motivo de certo escândalo, no final da vida já não era quase notada. E não se avexem de que eu tenha contato praticamente toda a história até aqui. Como talvez já tenham percebido não é essa pequena trama, quase tola, que vai realmente importar em Uma vida em segredo.

Essa seria, afinal, uma história pífia e sem sal, se Biela, através de sua pequena luta por sua reconstrução, não trouxesse forte na lembrança ‘’o riachinho correndo, o chuá-pá do monjolo, o som da água enchendo o cocho, o silêncio, o ranger do cepo na tranqueta, o chuá da água, o barulho chocho da mão caindo no pilão quando se pilava o arroz, mais duro quando se esfolava milho’’. Através da narração de Autran, que desentranha toda essa riqueza de lembranças de dentro de Biela, é que descobrimos quem realmente habita o corpo desengonçado e chucro de nossa protagonista, o que passa desapercebido por todos os outros habitantes da história, razão evidente do título do livro.

Sua relação com Constança, a prima que lhe acolhe em sua casa, chega a ser, inicialmente,seu porto seguro nesse novo mundo, evocando-lhe até mesmo a imagem de uma mãe que era só lembrança no fundo de uma rede, lhe beijando a testa. Ou então às fábulas de princesa que eram contadas a ela pela empregada negra, quase ama de leite orfã de mãe e de pai ausente. Sentindo-se na obrigação de receber a parente diante dessa situação difícil, Constança tenta acolhê-la e inseri-la na vida pequena burguesa da cidade de interior, o que não dura muito tempo, pois esta logo desiste frente à estranhisse da prima, chegando à ter certo repudio pela mesma.

Prima Constança e Biela, em cena do filme Uma Vida em Segredo(2002), de Suzana Amaral.

Mais próxima e recíproca se dá a relação com Mazília, filha de Constança, que ao tocar o piano apresenta à prima talvez a única coisa daquele mundo que realmente lhe toca, a música. O casamento e a mudança para outra cidade, entretanto, acabam fazendo com que essa amizade se perca no tempo, virando uma lembrança quase tão longe como os ruídos que vinham do fundão.

A maneira com que Biela se relaciona não só com os outros, aliás, mas com todas as coisas desconhecidas ao seu redor lembra muito a maneira com que Macabéa, da novela A Hora da Estrela, de Clarice Lispector, sentia as suas pequenas descobertas e sensações. Se esta ficava tão maravilhada ao ver pregos na vitrine que urina no próprio vestido, Biela, moça de seus dezoito anos, chora pela primeira vez na vida depois de ver Mazília tocar ao piano uma valsa. Até então, não sabia sequer o que era aquele objeto grande, escuro, no meio da sala.

São grandes suas semelhanças com a personagem de Clarice, afinal, as duas são personagens marcadas profundamente pela impossibilidade, perdidas em um mundo com o qual não conseguem se relacionar. Além disso, são ao mesmo tempo ingênuas, primitivas e dóceis, capazes dos atos mais desconcertantes que.

Não é de se estranhar, portanto, que a cineasta Suzana Amaral tenha se dedicado exclusivamente a esses dois personagens em sua curta filmografia, justamente adaptações dos dois livros aqui citados. Apesar das semelhanças, entretanto, elas guardam também suas particularidades, talvez mais pelo modo como são contadas do que por questões de personalidade.

Se Macabéa não sabe gritar, esse não é o caso de Biela: ela é calada, quieta, mas não muda. Dela não se ouviria quase nada a não ser que se soubesse a maneira como percebia as coisas, nas sensações que a prima tocando lhe causavam, das sutilezas de suas mudanças. Deixar de usar as roupas que Constança lhe deu, ir se calando aos pouquinhos, se ocupando das tarefas da casa, até se transferir de vez pro quarto dos fundos. Permitindo-nos esticar o ouvido pra esse muxoxo que é a sua vida é que Autran Dourado nos permite ouvi-la, sem que ela precise gritar.



Se Macabéa se emociona com pregos na vitrine, Biela, diminutivo de Gabriela, é também o nome de uma importante peça nas engranagens de carros. Segundo o Houaiss:
Substantivo feminino Rubrica: engenharia mecânica. a - haste de aço forjado ou fundido que, articulada em suas extremidades a duas peças móveis, transmite a uma o movimento da outra, modificando-o ou não
b - nos automóveis, caminhões, aviões etc., peça de ligação entre o êmbolo e o eixo de manivelas, a qual transforma o movimento alterno retilíneo do primeiro no movimento circular do segundo


Essa silenciosa luta pela apropriação de sua vida, por sua vez, me faz lembrar de outro célebre personagem da literatura, do qual ela ao mesmo tempo se afasta e se aproxima. Trata-se do Gregor de A Metamorfose, de Kafka, homem que um belo dia acorda transformado em uma barata. Assim como no seu caso, somente nós e o narrador partilhamos de sua saga íntima de adaptação à uma realidade nova com a qual não pode lidar, permanecendo oculta para o resto do mundo até mesmo que possa sentir esse mundo, como acontece com Biela.

Mesmo que no caso de Gregor a mudança seja dele, ao contrário de Biela, que se vê deslocada de mundo, os efeitos são razoavelmente os mesmos: afastar-se dos outros, fingir quase não existir. A diferença é que isso em Biela é reflexo de uma luta, um rompimento com os outros para se ligar àquilo que realmente lhe importava, mesmo que fosse a lembrança de passado evocada pela senzala de uma casa-grande. Não é por acaso, provavelmente, que ambos tenham uma morte tão triste, mas tão contrastante. Enquanto Gregor morre sozinho, provavelmente de fome e abandono, depois de desistir de viver trancafiado no quarto pela própria família, Biela é resgatada pela família e levada ao hospital. Chegando lá, toma sua última e verdadeira medida: não quer morrer no quarto, sozinha. Prefere morrer na ala dos indigentes, em companhia.

Se é esse o seu último passo na pequena trajetória que traça na sua nova vida, ele não é o único, e vários são os pequenos indícios que Autran nos dá durante a novela de que Biela é, faz e sente muito mais do que aparenta. Toda essa a sua reserva, afinal, não se trata de uma renúncia à vida, à sua fortuna, da qual nunca foi atrás desde a morte do pai, ou qualquer cosia do tipo, e sim uma volta àquilo que ela tinha perdido, ao sair do fundão, há tanto tempo: uma vida simples, isso sim. Uma vida em segredo.

Wednesday, January 23, 2008

Literatura e Cinema

por Darwin Marinho


O livro nos dá a liberdade de imaginar as coisas como queremos, embora haja alguma limitação quando o autor é muito detalhista, mas ainda assim há uma grande liberdade criativa, criamos o ambiente e os personagens a nossa maneira, suas vozes, seu jeito de andar, de se vestir (ou pelo menos acreditamos que fazemos isso). Quando o livro é adaptado para o cinema, tudo isso é roubado. Ler o livro antes do filme pode causar uma sensação de violação dos nossos direitos criativos, ler depois limita de forma considerável a nossa imaginação.

Ao exigir um filme igual ao livro, deixam-se de lado as intervenções criativas e necessárias (em alguns casos) dos diretores e roteiristas, limitar isso pode causar grandes prejuízos estéticos para o filme. Em “Laranja Mecânica”, Stanley Kubrick omitiu o último capítulo do livro e mesmo assim o filme é maravilhoso. As adaptações do Kubrick são incríveis: “Lolita” e “O Iluminado” são filmes tão bons quanto os livros (talvez melhores). Já “Lavoura Arcaica” de Raduan Nassar foi considerada pela cineasta Suzana Amaral (que dirigiu “A Hora da Estrela”) uma das piores adaptações do cinema porque os diálogos são exatamente iguais aos do livro, mas essa foi uma condição imposta ao diretor Luiz Fernando Carvalho, o seu trabalho criativo foi limitado, mas discordo da opinião da cineasta e considero o filme excelente.

Um dos grandes filmes esperados para 2008 é o “Blindness” do brasileiro Fernando Meireles, adaptação do romance “Ensaio sobre a cegueira” de José Saramago. O filme com orçamento milionário já me decepcionou por não ser falado em português, mas tem no elenco grandes atores ( Jullianne Moore, Mark Rufalo) e, mesmo com todas as falhas que venha a ter, a história do Saramago salvará o filme, assim como a do Gabriel Garcia Márquez salvou a adaptação de “Amor nos Tempos do Cólera” que foi duramente criticado pela língua utilizada, pelas atuação caricaturais e pela maquiagem, mas a história agradou muito, mérito do autor, não do diretor.

Mas o que é do autor e o que é do diretor? Livros ruins podem dar bons filmes ou vice-versa? Para acompanhar essas e outras discussões envolvendo cinema e literatura participe do próximo encontro do Por Mais Leitura, no próximo dia 26 na Biblioteca Leonilson que fica no Dragão do Mar.

Thursday, December 13, 2007

Nas férias



Do vermelho pro laranja: João Miguel, Ary, Alan, Naiana, Marina (espiritualmente), Diogo e Bruno


Bom, para quem não foi ou não ficou sabendo, o último encontro do Por Mais Leitura nesse mês aconteceu no última dia 8, Sábado, na Biblioteca Leonilson. No mesmo dia, aliás, saiu uma reportagem bem bacana sobre o grupo no jornal O Povo do mesmo dia, de onde tiramos a foto aqui ao lado. Para quem quiser conferir a matéria na íntegra, é só clicar aqui.

Em vez de dois encontros, um autoral e outro de textos de outras pessoas, nesse mês resolvemos juntar os dois em um só. O tema do encontro foi Literatura e Violência e a intenção de fazer uma só roda foi a de todo mundo poder planejar tranquilamente o seu final de ano. Seja para viajar, ficar em casa ou mesmo ler e descobrir coisas novas.

O tema do próximo encontro, entretanto, já foi definido: Literatura e Cinema. A data também já está marcada: a gente se encontra no dia 27 de Janeiro no mesmo bat-local e horário. Até lá eu posto pelo menos mais uma vez avisando. Próximo ano precisamos pensar um pouco como dividir melhor essa parte da divulgação, porque ela ficou meio abandonada, por mim mesmo, inclusive. De qualquer forma, quem quiser contribuir com o blog, tiver um texto que se enquadre no perfil dele, seja crítica de um livro, artigo sobre algum tema dentro do campo da literatura, envolvendo-se com outras artes e etc, seja bem vindo, é só manter contato conosco por aqui ou pelo orkut.


Vou tentar atualizar de vez em quando o blog com coisas interessantes que estejam acontecendo na cidade, como lançamentos de livro, cursos e etc. Fiquem ligados e não esqueçam que em Janeiro a gente tá de volta!

Até lá!

Tuesday, November 27, 2007

Feira do Livro Cabo Verde/Brasil

No folder da programação do Dragão do Mar desse mês um evento havia me feito ficar com a pulga atrás da orelha. Estampada na capa e contracapa do livreto, era anunciada a ''Feira do Livro Cabo Verde/ Brasil. O anúncio chamava a atenção, não só pelo tema pouco comum, como pelo fato de não haver mais detalhes sobre o evento, como datas e programação.

Hoje, por acaso, encontrei com uma estudante cabo-verdiana da faculdade que me entregou um panfleto sobre o evento, este bem mais enxuto que o folder do dragão, mas que finalmente me revelou o mistério. Primeiro: o evento começa hoje, terça-feira 27, e vai até essa quinta, dia 29. Segundo: a escolha do Ceará como sede não é aleatória. O que minha cara colega me antecipou é que os escritores cabo-verdianos que vão passar por aqui durante o evento são oriundos do movimento ''Claridoso'', que marcou o início do modernismo no país e que teve como grande influência escritores brasileiros, principalmente os nordestinos das gerações de 30 e 45.

O evento está sendo organizado pela Secult juntamente com quatro estudantes cabo-verdianos que fazem faculdade aqui em Fortaleza, entre os quais a amiga da qual falei. A programação deve contar com palestras, exposição de obras raras e mais de mil exemplares de livros de escritores cabo-verdianos para serem comercializados. E é bom aproveitar a oportunidade, porque a partir do próximo ano a feira se transfere para Cabo Verde.

Feira do Livro de Cabo Verde: Claridade na Terra da Luz - de hoje (27) a quinta-feira (29), no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura (rua Dragão do Mar, 81 - Praia de Iracema). Grátis. Mais informações: 3488 8600.

+programação: http://www.dragaodomar.org.br/index_new.php?pg=feiralivrocv

Monday, November 19, 2007

A extração da loucura: em novembro

A extração da pedra da loucura, de Hieronymus Bosch


O blog anda meio parado, mas continuamos com nossas atividades normais na Roda de Leitura. Esse mês o tema é Literatura e Loucura, e o próximo encontro é de textos autorais. Sábado, dia 24, no mesmo bat-local, Biblioteca Leonilson, das 15-18h, Centro Cultural Dragão do Mar.

Levem seus textos, se apresentem, sejam loucos ou não.

*A Roda de Leitura Por Mais Leitura é uma iniciativa independente e aberta a todos os interessados, cada um leva seu texto, lê, ouve os comentários, ou simplesmente escuta e participa da conversa. Um espaço para a troca de informações e experiências no universo da leitura, para iniciantes e iniciados.